Alto e pára o baile!

A historiografia baseada no contrafactual é deveras controversa. Não obstante, de tempos a tempos lá aparece mais uma obra baseada em se's e outras conjunções e preposições e outras coisas acabas em -ões, mas não só, e que indicam oposição de ideias. Mesmo contra factos, como a própria designação indica, esses autores erigem argumentos de como as coisas seriam diferentes, se tivessem sido diferentes. Muito se escreveu e continua a escrever sobre as virtudes, as vantagens, as desvantagens, os defeitos de tal exercício, meramente retórico, de imaginação, muitas vezes delirante. Um desperdício de papel, de um lado e doutro da barricada! A estes, bastava dizer: Ó meus amigos, vamos lá ver! Isto aqui não há se's nem meios se's! Foi assim, e pronto! Àqueles, era mesmo deixarem-se de sonhos parvos e decidirem vir para o mundo real outra vez, a sério, pessoal, deixem-se disso!
Quer dizer, eu, por um lado, até os entendo. Reescrever a história, de acordo com premissas perfeitamente alternativas, mesmo que não sejam as mais agradáveis ao nosso próprio sentir, pensar, não deixa de ser uma ideia engraçada! Claro, não tão engraçada como a possibilidade de reformular a história e o presente, alterando verdadeiramente o que teve lugar noutras calendas, já lá para trás! Pessoalmente, seria um prazer voltar atrás e poder evitar algum dos grandes erros que a humanidade cometeu ao longo dos tempos! E, quando digo erros, não quero com isso dizer cenas chatas, tipo o que aconteceu entre 1939 e 1945, com aquela história do Hitler e mais não sei quê. Sim, para aqueles dez, quinze tipos que morreram, foi uma cena chata, porque é sempre chato um tipo levar com um balázio, morrer gaseado, ou coisa parecida, e para o pessoal do Japão que levou com um cogumelo gigante em cima, pior ainda, que isso é coisa para doer! Para lá de provocar alucinações... presumindo, claro está, que eram cogumelos mágicos. A julgar pela luz e pelo fumo e pelas ratazanas de duas cabeças que nasceram por aquelas bandas, deviam ser mesmo. Ou aquela cena da Inquisição e do Índex, mais as fogueiras e isso, para hereges, judeus (estes ao menos estão em todas!), livros e espetadas e salsichas toscanas, ao estilo savonarola, ou então picantes, que não havia pessoal para uma boa comezaina como os veneráveis dominicanos. É que, realmente, essas coisas foram chatas, como outras, muitas outras, aliás, mas era mesmo essa a ideia. Ok, talvez o bigodinhos não tivesse nos planos perder a guerra, mas ele quis a guerra, ele e outros, houve uns que sofreram, sim, senhor!, mas disso se faz a história da humanidade, de sofrimentos em variadas formas, desde autos-de-fé a tomates entalados nos fechos das calças... Ou seja, foram coisas chatas, mas aconteceram assim não devido a um erro crasso e evitável, mas apenas porque a humanidade em si é inevitavelmente dada a ser motivo da sua própria destruição, um erro qualquer de fabrico, ou então excesso de concorrência entre espécimes.
Não, o que a mim me dá ganas de mudar é toda e qualquer situação onde seja evidente um erro clamoroso, diria mesmo parvo, uma qualquer coisa que tenha sido feita sem intenção, talvez por desatenção do seu responsável, e que tenha, com isso, provocado uma perpetuação de um desequilíbrio, a inverosimilhança de um passo em falso eternamente repetido. No fundo, ser o grilo falante a alertar a consciência daqueles que, ao longo da história, inscreveram a sua marca no rol de pedra dos falhanços básicos. Estar lá, nesse momento e dizer: Ó pá, não faças isso, pá! Não juntes o sabor a kiwi e a manga no mesmo iogurte! E quem diz iogurte, diz sumo. Porque, convenhamos... ok, morango e banana, razoável; tutti--frutti, aceitável; uma ou outra combinação de frutos silvestres, nada a obstar... agora, kiwi com manga? Laranja com maça e cenoura? Melancia com ameixa e pistachio? Eu nem sei se estas existem, mas a verdade é que, a partir do momento em que se começaram a produzir mash-ups alimentares de duvidosa qualidade e pertinência, todo o mundo se alterou profundamente. Pelo menos a parte do todo onde se se pode dar ao luxo de consumir dessas coisas, claro. Era isso que eu queria evitar, que um desgraçado rapazola engolisse em meia dúzia de goles metade da roda alimentar concentrada num só pacote, garrafa, ou outro tipo qualquer de embalagem!
Eu queria ser o tipo que chegasse à beira do farsolas que se saiu com a do Santo António que já acabou, do São Pedro que se está a acabar, e faz favor, ó São João, poderia por obséquio orientar um balãozito para eu me entreter e lhe dissesse: O Santo António, dia 13 de Junho; o São Pedro, dia 29 de Junho; o São João, dia 25 de Junho... não achas que estás a contar mal a história? É que, parecendo que não, é coisa para magoar os sentimentos do pedrito dizer que o moço está acabado, mesmo antes de começar! É isso, e é uma puta de uma parvoíce, também! Um erro que só mesmo quem não tem um calendário ou está com uma bebedeira tamanha pode cometer. Só vejo uma explicação racional que justifique este caso... é que, apesar de andar a perder capacidades, o povo costuma ter razão nestas coisas dos provérbios e das cantarolices, pelo que convém ter a certeza se não será mesmo assim, e a hipótese é a de que em Portugal se dê um estranho fenómeno de distorção no tempo e espaço. Só assim é que lá vai. Curiosamente, isso também justificaria um outro pormenor estranho que saltou à vista dos meus olhos um dia destes. Ia eu no passeio, não na rua, que isso seria parvo e perigoso, e estava distraidamente a ler os números das entradas para os prédios, porque quem não tem mais que fazer distrai-se assim, não é verdade?, 1257, 1345, 1235... Alto e pára o baile! (curiosamente, frase que serviria na perfeição para a troca dos santos, pelo que as peças começam a encaixar, a fazer sentido, a desenvolver uma estrutura uniforme de puzzle completo) Então, mas como é isto? Ainda passei lá mais uma vez ou duas, em dois dias diferentes, para confirmar. Eu não costumo andar muito pelo Japão, nem por outras bandas alucinogenicizadas, mas, como um dos efeitos desses produtos é, precisamente, o esquecermo-nos de que os tomámos, mais vale ter a certeza. E eles lá estavam, os três números nessa mesmíssima ordem... ou na inversa, conforme eu andasse para um lado ou para o outro. Ok, das duas uma, ou o tipo que pôs os números nem reparou que trocou um 2 por um 3, ou não tinha mais 2 e por isso pôs um 3 que é logo a seguir e o pessoal nem nota, ou, terceira, é uma distorção do espaço que ali está, e que provoca esta confusão a quem desconhece as coisas inicialmente. Eu voto na terceira!
Só um pormenorzito me incomoda, me atravessa o pensamento, como uma espinha a uma garganta: Por que razão uma distorção desse calibre, uma distorção no tempo e no espaço, (caramba!, já viram bem o que isso é?) se vem fixar em Portugal??? Pelo que um tipo aprende nos filmes, para lá de posições estranhíssimas e impraticáveis para quem não faz ginásio 5 horas por dia, uma coisa dessa dimensão deveria era andar pelos EUA, a terra das oportunidades, não?

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