O Erro de Freud

Tenho para mim que Freud se enganou. Pronto, é uma coisa que eu acho, não estou agora para grandes argumentos, até porque de Freud não percebo nada. Porém, que se enganou, enganou. Não quero com isto dizer que as obras fundadoras da psicanálise são uma sucessão de erros em vários tomos, até porque nunca li nenhum deles... mas enganou-se, pronto. E se o António Damásio disse que o Descartes errou, por que razão não posso eu também dizer o mesmo do Freud? Pelo menos numa coisa enganou-se.
O outro Eu que vive dentro de cada um, na subcave do consciente, aquele Eu cheio das virtudes que o quotidiano não tem, mas deseja ter, aquele Eu que escarnece do si consciente, por ser fraco perante a realidade do mundo, aquele Eu a que Freud se lembrou de chamar superego não é super coisa nenhuma. Hiper, isso sim, que super já o é o Ego que cada um dá por si a carregar diariamente.
Hiper, como um megalómano Eu, transcendente a tudo o que possa desenvolver-se na realidade física de cada pessoa, um super super. Baseia-se esta proposição fundeada em coisa alguma no facto de cada um de nós ser sempre um super-eu, nomeadamente no que diz respeito a rebaixar, a aviltar, a criticar ferozmente os outros. Espécie maravilhosa, o homo sapiens sapiens! Não olhando a defeitos endógenos, que é como quem diz popularmente: Sem olhar para o próprio umbigo!, não praticando jamais exercícios de auto-reflexão frente a um espelho de almas e carácteres, é capaz, não obstante, de lançar a outros seres da mesma espécie o tipo de considerações que, tão facilmente, tão justamente, se aplicariam a si mesmo. Algo que, mais uma vez, a sabedoria popular tão bem condensou em um outro proverbial aforismo: Falar/Dizer o roto ao nu!, diz o povão, sintetizando na sua ingenuidade vernácula mais uma verdade, para muitos, ainda assim, insondável, da natureza humana.
Passou-me esta ideia pela cabeça ainda antes de ouvir falar de uns tais de relatórios norte-americanos, dos EUA, portanto, sobre desrespeito aos direitos humanos um pouco por todo o mundo, passando, abertamente, ao lado do próprio país. No fundo, essa foi a confirmação de que não precisava para nada, mas que sempre dá o seu jeito, quanto mais não seja pela grandeza do exemplo, atestando assim a veracidade do que afirmei. O homem consciente de si mesmo é, por si só, um superego, um super-eu, individual ou colectivamente, acaba por ser a novidade que tal relatório trouxe ao meu pensamento, nomeadamente na perspectiva que tem do outro Ego ao lado, dos outros egos que com ele ocupam este planeta a que chamamos humanidade.
Passou-me esta ideia primeiramente pela cabeça, e continua passando quase diariamente, ao ouvir pessoas a falar dos defeitos de outras do cimo dos seus pedestais, dos seus altares estreitos de virtuosismos, com uma sincera expressão de superioridade mental, ética, moral, física até. Aconteceu ainda no outro dia, ao ouvir uma fêmea abraçar com vigor a ideia de uma outra concorrente na luta dos cios e dos acasalamentos ser um estrupício, poço de fealdade e assimetria corporal, olvidando, encapotando, o outro facto, o de ela própria estar infectada de tais considerandos. Lancei-lhe, num olhar de desprezo, a palavra dos supra referidos ditados, e ainda a de um outro: Quem tem telhados de vidro não atira pedras para o ar!, e ela, da mesa ao lado, viu-me, percebeu-me e calou-se.
Fosse sempre assim que os super-vilões conseguissem arruinar os superegos armados ao pingarelho que andam por aí...

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