Isto é inadmissível! Uma semana de atraso!

Sebastião, jovem formoso,
Cabeça loira, usava coroa
Que lhe dava ares de poderoso,
Que ele usava um pouco à toa.

Pra África sonhava em ir,
Ganhar almas pra Cristandade.
Ficou-se às portas d' Alcácer-Quibir,
Foi-se na loucura e virgindade.

Porque Sebastião não fodia,
Tinha a mulher como um papão.
Por isso nunca deu a alegria
Ao reino, de fazer um varão.

Veio pró poleiro um velhadas,
Seu tio que também era cardeal,
Tinha as sotainas borradas
E mijava nas plantas do quintal.

Toda a vida homem virgem,
Por preceito da devoção,
Podia então tirar ferrugem,
Já só não tinha era tesão.

Quinou também o velhote
Sem dar ao reino varonil.
A luta p'la coroa foi fartote;
Candidatos, mais de mil.

De Parma, Sabóia e do Crato,
Até de Roma e França,
Mas era pequeno o prato
E só o de Espanha encheu a pança.

Filipe em Espanha era já segundo,
Deste lado ficou primeiro.
Mandava em mais de meio mundo,
Império com sol o dia inteiro.

Mas todo o ano havia guerra
E sobe-sobe com os impostos,
Pra combater Holanda e Angleterra
E trazer ao povo mil desgostos.

Morreu Filipe, veio Filipe,
E 'inda outro Filipe arribou.
Foram três os desta estirpe
Que o tesouro encazinou.

Pagava povo, clero e nobreza
(Que era coisa de espantar)
Ficava o reino nesta pobreza
De não ter como se remediar.

Sonhou o povo assim tratado
Qu' havia Sebastião de regressar
Num dia frio e enevoado,
Lá das terras d' além-mar.

Esperou-se à toa dias e anos
Pela chegada do Salvador,
Mas no horizonte não vinham panos
D' el-rei Sebastião nosso senhor.

Como não chegava el-rei no nevoeiro,
E não saía o reino deste trabalho,
Foram-se quarenta ao Terreiro,
Mandaram o Vasconcelos pró caralho.

Trouxeram João de Trás-os-Montes
Para ser o IV de Portugal.
Ele que nunca quis ser rei antes,
Por preferir música e coiso e tal.

Vendo o trono assim levado,
Filipe III ficou fodido.
Mandou o reino ser tomado
Pelo exército de peito erguido.

Mas breve saiu de Portugal
Outra vez pelo mesmo caminho,
A enfiar-se no Escorial
Com o cu todo assadinho.

Daqui as gens lhe deram luta,
Português era outra vez tudo.
- Vai-te embora, à ganda puta,
Desgraçado de queixudo!

Fez-se assim a Restauração,
No primo dia de Dezembro.
Não mais houve fervor como então
Neste povo a quem relembro:

Mandou-se o castelhano embora,
O espanhol voltou-se a mandar.
Só não se mandou daqui pra fora
Tanto português que nos quer enrabar!

Frei António Jerónimo Landeira (inícios do séc. XIX)

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